PROJECT SYNDICATE, 30 abril 2025
OTAVIANO CANUTO e SABRINE EMRAN
RABAT/WASHINGTON (D.C.) – A transição para as energias limpas alimentou a corrida global pelos minerais essenciais, transformando elementos como o lítio, o cobalto e as terras raras em ativos estratégicos. No centro desta emergente guerra de recursos está a escalada da rivalidade entre a China e os Estados Unidos, ambos bem cientes de que o controle das cadeias de fornecimento de minerais é essencial para o domínio tecnológico.
Os minerais críticos – especialmente lítio, níquel, cobalto, manganês e grafite – são essenciais para setores como os semicondutores, as baterias para veículos elétricos, as energias renováveis e a defesa. As terras raras, por exemplo, são vitais para os ímãs permanentes usados em turbinas eólicas e motores de veículos elétricos, enquanto as redes elétricas que sustentam as economias modernas dependem de enormes quantidades de alumínio e cobre.
A importância geopolítica dos minerais críticos vem aumentando nos últimos anos, impulsionada não só pelo seu papel na transição ecológica, mas também pela crescente fragilidade das cadeias de abastecimento concentradas. A China domina hoje a transformação de minerais em nível mundial, refinando mais de 60% do lítio, 85% dos elementos de terras raras e 95% do manganês.
Este domínio criou novas vulnerabilidades estratégicas. Um bom exemplo são as recentes restrições da China à exportação de gálio e germânio, que demonstram como as grandes potências podem utilizar fatores de produção críticos como armas para obter vantagem tecnológica.
Em última análise, a trajetória da transição verde dependerá não só da localização dos depósitos minerais, mas também da forma como os governos se adaptarem. À medida que os países se afastam dos combustíveis fósseis, correm o risco de substituir uma forma de insegurança de recursos por outra, a menos que enfrentem a dinâmica complexa da oferta e procura de minerais. Contudo, grande parte do debate atual está focado na expansão da oferta, ignorando os potenciais ganhos de eficiência, bem como os avanços na reciclagem e substituição de materiais.
É importante notar que o domínio da China em matéria de recursos não resulta de vastas reservas minerais, mas de uma previsão estratégica. Embora controle só uma fração dos minerais do mundo, a China passou décadas reforçando suas capacidades de processamento por meio de políticas industriais específicas, o que lhe permite controlar as principais fases da cadeia de produção global. Em consequência, a tecnologia emergiu como o eixo central do realinhamento geopolítico.
Enquanto os EUA mantêm uma vantagem competitiva no planejamento de semicondutores avançados e em equipamentos de fabricação, a China domina as cadeias de abastecimento de energia limpa, desde os painéis solares às baterias. Mas os EUA continuam totalmente dependentes das importações de 15 minerais críticos – incluindo gálio e terras raras – e mais de 50% dependentes de outros 34.
Dado que a China é o principal fornecedor de quase metade destes minerais, é evidente que a dependência dos EUA em relação aos recursos constitui uma ameaça estratégica para setores-chave, incluindo produção de semicondutores, defesa e energia limpa. Reconhecendo estas vulnerabilidades crescentes, o ex-presidente dos EUA, Joe Biden, assinou a Lei CHIPS e Ciência de 2022 para impulsionar a fabricação de semicondutores. O governo do presidente Donald Trump está agora buscando uma abordagem ainda mais orientada para o mercado interno, com o objetivo de acelerar a extração de minerais essenciais e, ao mesmo tempo, agilizar o processo de licenciamento para projetos de mineração em terras federais.
Mas a segurança dos minerais não pode ser alcançada apenas através da produção nacional, razão pela qual o governo Biden se juntou a aliados como Austrália, Canadá e União Europeia para estabelecer a Parceria para a Segurança dos Minerais – iniciativa destinada a “friendshoring” a produção de minerais. Trump, pelo contrário, adotou uma abordagem mais assertiva, ameaçando adquirir a Gronelândia “de uma forma ou de outra” e tentando pressionar a Ucrânia por um acordo sobre minerais críticos.
A disputa pelos minerais críticos pode ter profundas implicações geopolíticas, já que os países em desenvolvimento ricos em recursos são cortejados tanto pelos EUA como pela China. Ao mesmo tempo, as indústrias globais enfrentam a perspetiva de cadeias de abastecimento fragmentadas e divididas por linhas geopolíticas.
A África, sede de quase 30% das reservas minerais conhecidas – incluindo 85% do manganês mundial e 80% da platina e do crômio – emergiu como um ponto focal da competição por recursos. Isto é especialmente verdade para países como a República Democrática do Congo (RDC), que detém cerca de 70% das reservas mundiais de cobalto, e a África do Sul, rica em platina.
No entanto, a desconexão entre a vasta riqueza de recursos de África e seu desenvolvimento econômico limitado continua a ser notória. Muitas economias africanas, como a RDC, dependem fortemente das exportações de matérias-primas, não tendo investido de modo significativo na transformação com valor agregado. Como consequência, as economias subsaarianas captam, em média, só 40% das receitas potenciais dos seus recursos naturais – lacuna que reflete um fracasso sistêmico mais profundo em libertar todo o potencial econômico destes ativos.
A bauxita é um caso que ilustra as vastas oportunidades econômicas perdidas devido à exportação contínua de produtos de base não-transformados. Enquanto o minério de bauxita bruta é vendido por cerca de US$ 92 a tonelada, a sua forma refinada – o alumínio – ronda os US$ 2.438 a tonelada.
Embora detenha a maior parte das reservas mundiais de cobalto, a RDC continua fortemente dependente das exportações de matérias-primas. Esta dependência excessiva, combinada à falta de integração vertical e de diversificação econômica, deixa o país vulnerável a quebras acentuadas se os preços globais do cobalto caírem durante um período prolongado.
A obtenção de benefícios mútuos para os países africanos ricos em minerais e para as indústrias globais que dependem dos seus recursos exige o afastamento dos modelos de exploração que há muito moldam a economia global – e os EUA estão em posição única para oferecer tal alternativa. Para isso, a América deve defender um quadro “E3”: economicamente viável, ambientalmente sustentável e eticamente fundamentado.
Além da inovação tecnológica, a política de minerais críticos dos EUA deve ser orientada por um compromisso ético e pelo desenvolvimento de infraestruturas. O Corredor do Lobito – projeto apoiado pelos EUA que visa renovar a linha férrea que liga Angola às minas de cobalto e cobre da RDC e da Zâmbia – demonstra como o desenvolvimento estratégico de minerais pode gerar valor para as economias locais, apoiando o processamento no país em vez de depender apenas das exportações de matéria-prima.
É encorajador o fato de os EUA terem manifestado sua vontade de colaborar com os países subsaarianos ricos em minerais. Mas a presença limitada de operações mineiras do setor privado dos EUA na região, juntamente com a rápida mudança do panorama geopolítico, sublinha a necessidade de uma abordagem inovadora e estratégica centrada na criação de valor no longo prazo e em parcerias mutuamente benéficas.
Tradução por Fabrício Calado Moreira
OTAVIANO CANUTO
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Otaviano Canuto, a former vice president and executive director of the World Bank, executive director of the International Monetary Fund, vice president of the Inter-American Development Bank, and deputy minister of finance of Brazil, is a non-resident senior fellow at the Brookings Institution and a senior fellow at the Policy Center for the New South.
SABRINE EMRAN
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